quinta-feira, 26 de fevereiro de 2009

Mostra-me o caminho

Nos dias de hoje é fácil chegar a todo o lado ainda que seja a um "lado" desconhecido. As novas tecnologias e o papel vital do GPS fazem as maravilhas e o desconhecido torna-se conhecido antes mesmo de nos ser apresentado.
Como sou um pouco "anti" novas tecnologias - apesar de ter GPS no carro - continuo a apostar na velha maneira de nos safarmos de um aperto (o que quer dizer parar de andar às voltas e ao fim de 2 horas confessar que estamos perdidos).
Hoje em dia defendo essa velha maneira de sabermos chegar ao desconhecido como um manter de tradições, falar com gente que nunca vimos e quebrar com as distâncias impessoais que as recentes tecnologias impõem.

Sendo assim sou apologista da velha maneira que nada mais é do que:

- encostar a viatura onde for possível (geralmente no meio da estrada);
- ligar os 4 piscas (verdadeira situação para aplicar os 4 piscas e muito possivelmente a única);
- dar à manivela (se o carro for antigo) ou carregar no botanito para descer o vidro;
- por a cabecinha de fora e gritar algo como «ó sasha vor, pode-me ajudar?» para alguém que finge não nos ver e até baixa a cabeça (só ganhamos a atenção se a projecção de voz for de tal maneira escandalosa que a dita pessoa se sente na obrigação de ir até nós que mais não seja para nos calar e parar com a vergonha).

E está feito todo o processo da velha maneira!
O contacto com as pessoas neste tipo de situações é totalmente imprevisível e sempre hilariante quando nos respondem como se fossemos da terrinha e por isso temos obrigação de saber onde é o centro, a pastelaria XYZ ou o cinema B...

Depois há outras pessoas que a explicar dizem:
«Ora, não tem nada que saber.» (ai tem tem porque senão tivesse que saber não perguntavamos).
E desatam a traçar mapas no céu com as mãos a virarem para a esquerda ou para a direita, arriscando-nos a levar um tabefe, tal é o entusiasmo da pessoa que nos explica a direcção e tal é o agitar das mãos.

Mas as novas tecnologias ganham muitos adeptos e no meio destes adeptos existem aqueles que fazem uso das tecnologias sem que haja uma ínfima percentagem de necessidade.
Curiosos? Querem um exemplo? Acabou de ganhar um óscar por isso! E os slogans são:

«Faz uso do teu GPS no autocarro!»
«Não confies no motorista, ele certamente não sabe o caminho e pode enganar-te!»
«Sê mais esperto que o motorista. Ensina-lhe os atalhos que o teu GPS indica.»
«Não levantes os olhos do GPS ou arriscas-te a passar a paragem onde o teu GPS diz para saíres.»

PS - já percebi porque tens um sorriso idiota. És a minha motivação!

sexta-feira, 20 de fevereiro de 2009

O dia-a dia de um super herói disfarçado


Foi, pouco antes do almoço, que senti as suas primeiras investidas. Uma leve cólica, ocasional, um deslocar tímido do gás. A coisa prometia, mais cedo ou mais tarde, não haveria nada a fazer, teria que ir ao WC. Almocei, como de costume, de forma serena e equilibrada comendo, ao contrário do costume, - pito assado- , uma bela lasanha Pingo Doce. Terminado o repasto, dirigi-me ao meu local de trabalho, não sem antes ter bebido aquele maravilhoso café em copo frio que, até á data, tem feito as delicias dos colegas com quem trabalho e que, diga-se em abono da verdade, é considerado por muitos o ex-libris do piso 5.
Não me foi dado tempo, sequer, para terminar o longo trajecto que separa a porta de entrada, da minha secretária.
O alarme soou. Arregalei os olhos. Conjeminei, rapidamente, qual a fuga mais rápida, qual a solução viável para tamanho sufoco. Os nervos apoderaram-se do meu corpo. As pernas entorpecidas pelo mal-estar, pareciam não querer colaborar. Com esforço e, penso eu, visível pânico, lá cheguei. Estava quase. O extenso corredor foi vencido sem complicações. Fica só a faltar o ziguezaguear desconfortável da saída, está quase. A entrada, nesse momento, de alguns colegas que, tal como eu, regressavam do almoço, obriga a uma paragem forçada com vista a esclarecer pormenores “trabalhisticos”. O caos estava instalado. A desordem apoderou-se de mim, das minhas entranhas, do meu ser. A dor agudizava-se, o abdómen contraía-se em espasmos dolorosos, a porta branca casca-de-ovo abria-se, o fim estava próximo. Das duas soluções possíveis, paralelas, de fronte para mim, uma delas adivinhava-se impossível. Era a da esquerda. A porta do WC masculino que se encontra á esquerda de quem entra, estava visivelmente fechada. Por certo outro como eu, defecava, prazenteiro, gozando dos prazeres que o acto proporciona. Sem pensar, ditou-me o instinto a sábia decisão de, como é lógico, optar sem mais delongas pelo sanitário disponível. O da direita. Acendi a luz. Não acendeu. Hesitei. Verifiquei, num ápice, se a porta da esquerda se encontrava devidamente trancada ou se, apenas por educação, alguém a encostou. Trancada! Já não estava em mim, pressionei repetidas vezes o botão que, por norma e inexplicavelmente faz ligar a luz daquele espaço mas, foi em vão. A estúpida da lâmpada teimava em não acender. Pensei: - Vou a outro piso! Repensei: - Poderá acontecer-me o mesmo! Entrei na casa de banho ás escuras trancando, ás apalpadelas, a porta atrás de mim.
Já estava, agora era safar-me! Tacteando, levantei a tampa da sanita. Era lindo se não o tivesse feito! Baixei as calças certificando-me de que nada foi deixado ao acaso e deixei vir a mim, proporcionadas pela desova, ondas avassaladoras de prazer reconfortante.
Voltei a mim. Sou novamente o “eu” que conheço.


Agora mais lúcido, apercebi-me que o que me separava do mundo real era apenas a luz ténue que passava por baixo da porta e que vinha da zona dos urinóis. Zona contigua ao espaço que agora ocupava. Isso e o som pouco nítido dos passos e vozes que passavam junto daquele WC. Pensei na minha triste imagem. Que vexame. Que falta de dignidade. Eu e o ridículo, os dois, na companhia um do outro, naquele espaço exíguo. Triste figura humana.
Assaltou-me, de rompante, um pensamento: Haveria papel, naquela latrina inóspita? E se não houvesse? Que faria eu? E se, por engano, alguém tivesse colocado o resto do rolo de papel higiénico noutra parte daquela casa de banho? Talvez o colocassem por baixo do autoclismo. Só para, certamente, dificultar a tarefa a outros que, como eu, tiveram a coragem de dar o passo, ás cegas, para o abismo e ficar, por “mea culpa”, em tamanho desespero. Fui confirmar, apalpando. Estava lá, no sitio de costume e era suficiente para pôr fim á minha miséria. Baril. nem tudo é mau. Mentira! Apagou-se, naquele momento, a luz da casa de banho contígua á minha. Agora sim, da penumbra passei á escuridão total. Indistintas vozes ouviam-se, ao fundo, deixando antever a possibilidade de, a todo o momento, entrar alguém de rompante na casa de banho e, de forma automática, fazer ligar a luz. As vozes foram-se extinguindo gradualmente até deixarem de se ouvir por completo.
Alguma coisa teria de fazer. A estadia, além de demorada, estava a tornar-se desconfortável. Diz-se que os cegos, desprovidos do sentido da visão, desenvolvem os quatro sentidos que sobram. É bem verdade, pensei eu. Dei comigo a verificar que naquele momento me doíam as pálpebras de tanto arregalar os olhos em busca da luz que não havia. As narinas, doridas de tão abertas que estavam, tremiam, exaustas. O odor era desta vez, mais pestilento que das outras vezes que me dediquei a tal pensamento. Estava a sofrer. Era o momento de por fim àquela situação. Tacteei, cortei o papel que julguei ser necessário e procedi ao movimento de limpeza das partes. Pus-me de pé. Tratei de vestir as roupas que antes depositei nos tornozelos e pressionei o botão de descarga. Finalmente, acabou tudo.
Saí vitorioso. Sentia-me bem. Foi um teste á resistência humana, e eu ultrapassei-o.
De novo na empresa, passei orgulhoso pelas fileiras intermináveis de colegas que, sentados nas suas secretárias, nem por sombras adivinhavam, a tremenda batalha que tinha acabado de travar. Olhei-os de soslaio. Senti-me diferente.
Voltei ao meu local de trabalho, extenuado. Ao sentar, a dúvida assaltou-me: - Terei limpo o rabo á camisa?

domingo, 15 de fevereiro de 2009

Obrigado, 30 anos depois...



Obrigado Bissau em Agosto de 1973. Obrigado a Alcáçovas em Setembro do mesmo ano. Um cumprimento especial para o dia 24 de Março de ´74, algures.
Obrigado, ao ainda Capitão Otelo, por aquele dia na Pontinha. A minha melhor vénia para os Srs. Paulo de Carvalho e Luís Filipe Costa. A Leite de Vasconcelos, á cidade de Grândola por apenas existir, á canção que a dignifica e a Zeca Afonso, homem que gostaria de ter conhecido. Aos três, o meu sincero agradecimento.
Ao Tenente-Coronel Carlos de Azeredo e em especial a si, Exmo. Sr. Capitão Salgueiro Maia, respectivos ajudantes, participantes e colaboradores na acção, o meu mais sentido abraço. Por si, por vós, é possível hoje viver feliz em Portugal. Por fim, á senhora cujo nome não sei, que naquela manhã de Abril distribuiu cravos viçosos pelos homens de farda militar, obrigado.
Muito obrigado!

quarta-feira, 11 de fevereiro de 2009

PRELÚDIO

Diz quem sabe, que o prelúdio deixa antever um pouco da obra que se segue. È uma espécie de abertura, mas com pequenos excertos, pontuais, do concerto ou ópera, que de seguida é apresentado. Não pretendo iniciar uma obra. Muito menos literária. Também não quero fazer uma espécie de pré-apresentação daquilo que faço tensões de escrever. Nem tão pouco, confesso, sei o que irei escrever.
Decidi chamar-lhe Prelúdio apenas porque achei que, enquanto titulo, iria soar bem. Teria alguma personalidade, algum impacto e, com alguma sorte, suscitaria a curiosidade do leitor que, sem mais demoras, trataria de mergulhar no texto com a suspeita de que algo grandioso lhe seria apresentado. Algo como o levantar do véu de um segredo que todos querem saber.
Lamento. Não é nada disto. Chamei-lhe Prelúdio apenas porque este antecede, como sabemos, aquele que se segue. Vem em primeiro lugar, como nas obras musicais. É sabido de antemão que, numa ida á ópera, o primeiro espectáculo a que assistimos é ao prelúdio. O da ópera. O seu prelúdio.
Em suma: Toda a obra que se preze tem o seu respectivo prelúdio. E eu, sabendo que vou enriquecer este “blog” com alguns dos meus melhores “posts “, senti a necessidade de impingir ao leitor, este prelúdio. Uma espécie de ritual iniciático daquela que é a seita secreta dos que escrevem, orgulhosos, em “blogs” duvidosos e de parca ( não confundir com parka) audiência.
Talvez com o intuito de exasperar, nesta fase, o leitor, relembro que, -como disse acima- o prelúdio deixa antever um pouco da obra que se segue e este não é afinal, uma excepção. Afirmo pleno de certezas que este prelúdio faz jus aos textos que se seguirão. Á semelhança deste que agora redijo, os seguintes textos serão, por certo, tão ricos em conteúdo e criatividade como este que agora lê… Lamento.

?

Na vida há dias e dias.
Nuns estamos assim, noutros estamos assado.


Para mim...
este é o pensamento mais profundo em 30 anos de existência e garanto-vos que outras palavras como estas, que articuladas e interligadas produzem um espanto de veracidade e profundidade, só daqui a mais uns 30 anos. A profundidade destes pensamentos exige pois um ciclo e não pode ser coisa pequena.

Para ele...
é de tal modo grandioso que Karl Popper e Sócrates devem estar neste momento a dar voltas nas respectivas campas. Esquece lá as mensagens altamente metafísicas e espirituais que partilhamos... isto sim é... grandioso!