domingo, 14 de março de 2010

Ser amante...

Muitas pessoas têm um amante, e outras gostariam de ter um. Há também as que não têm, e as que tinham e perderam. Geralmente são estas últimas que vêem ao meu consultório para me contar que estão tristes ou que apresentam sintomas típicos de insónia, apatia, pessimismo, crises de choro, ou as mais diversas dores.
Elas contam-me que as suas vidas correm de forma monótona e sem perspectivas, que trabalham apenas para sobreviver e que não sabem como ocupar o tempo livre. Enfim, são várias as maneiras que elas encontram para dizer que estão simplesmente a perder a esperança.
Antes de me contarem tudo isto, já tinham estado noutros consultórios, onde receberam as condolências de um diagnóstico firme: "Depressão"... além da inevitável receita do anti-depressivo do momento. Assim, depois de as ouvir atentamente, eu digo-lhes que elas não precisam de nenhum anti-depressivo. Digo-lhes que o que elas precisam é de um Amante!
É impressionante ver a expressão dos olhos delas ao receberem o meu conselho. Há as que pensam: "Como é possível que um profissional se atreva a sugerir uma coisa destas ?!". Há também as que, chocadas e escandalizadas, despedem-se e não voltam
nunca mais. Às que decidem ficar e não fogem horrorizadas, eu explico-lhes o seguinte: Amante é "aquilo que nos apaixona". É o que toma conta do nosso pensamento antes de adormecermos, e é também aquilo que, às vezes, nos impede de dormir. O nosso Amante é o que nos mantém distraídos em relação ao que acontece à nossa volta. É o que nos mostra o sentido e a motivação da vida.
Às vezes encontramos o nosso amante no nosso parceiro, outras vezes, em alguém que não é nosso parceiro, mas que nos desperta as maiores paixões e sensações incríveis. Também podemos encontrá-lo na pesquisa científica ou na literatura, na música, na política, no desporto, no trabalho, na necessidade de nos transcendermos espiritualmente, numa boa refeição, no estudo, ou no prazer obsessivo do nosso passatempo preferido...
Enfim, Amante é "alguém" ou "algo" que nos faz "namorar" a vida e nos afasta do triste destino de "ir vivendo". E o que é "ir vivendo"? "Ir vivendo" é ter medo de viver. É vigiar a forma como os outros vivem, é o deixarmo-nos dominar pela pressão, andar por consultórios médicos, tomar remédios multicoloridos, afastarmo-nos do que é gratificante, observar decepcionados cada ruga nova que o espelho nos
mostra, é aborrecermo-nos com o calor ou com o frio, com a humidade, com o sol ou com a chuva. "Ir vivendo" é adiar a possibilidade de viver o hoje
, fingindo contentarmo-nos com a incerta e frágil ilusão de que talvez possamos realizar algo amanhã.
Por favor, não se contentem com "ir vivendo". Procurem um amante, sejam também um amante e um protagonista da vossa vida... Acreditem que o trágico não é morrer, porque afinal a morte tem boa memória e nunca se esqueceu de ninguém. O trágico é desistir de viver, por isso, e sem mais delongas, procurem um amante.
A psicologia, após estudar muito sobre o tema, descobriu algo transcendental: "Para se estar satisfeito, activo, e sentirem-se jovens e felizes, é preciso namorar a vida".

Texto: Dr. Jorge Bucay
Livro: "Hay que buscarse un Amante"

7 comentários:

Gustavo Carneiro disse...

Muito bom conselho, este do «amante», com ou sem aspas... Há que «pegar a vida pelos cornos» e «marrar até morrer»...

الرجل البسيط disse...

Delicioso! Bela prosa.
Bjs.

Unknown disse...

Lindo e profundo... um bom conselho a ser seguido.

Anónimo disse...

Acrescentaria: “de ir sobrevivendo”…
«Ter medo de viver»… Bem verdade, e “o medo, o medo levanta muros, e ergue bandeiras para nos deter”. Muitas vezes parece que não temos (e falo por mim) um projecto nesta vida que se adeqúe à nossa individualidade. Acho que isso acontece por o Homem ser um animal insaciável. E então, acabamos por perder, ou melhor, não desfrutar das pequenas gotas que caem todos os dias, mas mesmo todos os dias, ao nosso lado, porque queremos abarcar o Oceano inteiro, e consequentemente o que acontece... “ir vivendo”.
«Amante é aquilo que nos apaixona». Pois posso dizer que hoje vivo, hoje, ofereceram-me “de mão beijada” um amante – o texto!
E já viram como é bom, podemos ter vários amantes em simultâneo! Neste caso específico, até eu digo: Viva a poligamia!

Anónimo disse...

Acrescentaria: “de ir sobrevivendo”…
«Ter medo de viver»… Bem verdade, e “o medo, o medo levanta muros, e ergue bandeiras para nos deter”. Muitas vezes parece que não temos (e falo por mim) um projecto nesta vida que se adeqúe à nossa individualidade. Acho que isso acontece por o Homem ser um animal insaciável. E então, acabamos por perder, ou melhor, não desfrutar das pequenas gotas que caem todos os dias, mas mesmo todos os dias, ao nosso lado, porque queremos abarcar o Oceano inteiro, e consequentemente o que acontece... “ir vivendo”.
«Amante é aquilo que nos apaixona». Pois posso dizer que hoje vivo, hoje, ofereceram-me “de mão beijada” um amante – o texto!
E já viram como é bom, podemos ter vários amantes em simultâneo! Neste caso específico, até eu digo: Viva a poligamia!

acatar disse...

a que propósito veio este post?

beijos e abracinhos para os estarolas.

Ps: preciso de boleia para aquela coisa que vamos ter daqui a uns dias.

Makira disse...

O propósito?... porque descobri que és o meu amante.
Aquela coisa?... claro mano! Vais comigo!